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ENTREVISTAS

Resumidas, para não dar spoiler do filme que vem aí.

SANDRO

“Não foi bom ficar parado… A gente quando passa uma semana parado, dois dias parado, quem trabalha nesse ramo não tá acostumado, a gente fica preocupado, com vontade de sair de casa pra trabalhar e não consegue. " Sandro é dono de um lixado, uma espécie de facção que faz o serviço de acabamento que deixa as peças únicas e cheias de detalhes. No filme ESTOU ME GUARDANDO PARA O CARNAVAL CHEGAR, ele aparece na cena em que os jovens cantam uma música do Racionais MC enquanto trabalham.

Ele diz que as pessoas falam com ele na rua, comentando que está famoso, por conta do filme. Ele gostou bastante disso. Durante o lockdown, em 2020, Sandro precisou viver da ajuda da família e dos amigos - teve que vender por 3 mil reais um som que valia 10 mil, para pagar as contas. Quando chegou o auxílio, foi um alívio, ajudou bastante, mas nem todo mundo conseguiu receber. Sandro conta que em Toritama a doença foi fraca. Não foi como no Amazonas (ele se refere à recente crise de oxigênio que levou várias pessoas à morte por asfixia em Manaus). 

 

Sandro conta também que no início do lockdown ficou totalmente parado, sem trabalho, e que gostou de aumentar a convivência com a família. Para passar o tempo, ficava assistindo, ou ia pescar na barragem. Ao mesmo tempo, ficou triste também sem trabalhar e sem ganhar dinheiro. Ele conta que a igreja não ajudou ninguém. Quando conseguiu receber o auxílio, ele e a esposa pagaram o aluguel atrasado, contas de energia e comida. Recebeu ajuda também dos clientes mais fiéis, que sempre levaram peças para ele trabalhar. A maior novidade é que Sandro agora é avô.

 

Perguntamos se, com o aumento do custo de vida , ele pensa em cobrar mais caro pela mão de obra. Ele diz que não pode aumentar o valor da peça por causa da concorrência. Custa 0,25 para lixar cada peça. Para fazer o serviço mais elaborado, ele cobra 0,50 por peça. Faz 10 anos que é o mesmo preço. Ele diz que não consegue mais pagar as contas com esse trabalho e, do jeito que está difícil, acha mais possível ter que reduzir o preço do serviço do que aumentar. "É o que resta para nós aqui."

LEO

“Deus diz: pense no hoje porque o ontem já passou e amanhã talvez nem chegará… “ Leo é um faz-tudo que adora filosofar sobre a vida. Personagem carismático do filme anterior, trabalha sem vínculo empregatício e não gosta de passar muito tempo no mesmo lugar. Quando ficou tudo parado em Toritama, foi para Paudalho e lá não faltou trabalho nem por um para ele. Depois que a produção do jeans voltou a funcionar, ele voltou à Toritama. Leo prevê que a situação ainda vai piorar muito: "Quem tem um negocinho, um dono de um supermercado, quem tem uma plantação, 3, 4 5 casas alugadas, tem alguma coisa… Não dá pra sonhar mais não. Nesse tempo que a gente tem agora acabou-se o sonho.

CANÁRIO

Na vida de Canário, pastor de ovelhas e cabras que é personagem do filme "Estou me guardando...", o novo coronavírus não mudou muita coisa. As cabras continuam nascendo, pastando e morrendo do mesmo jeito que antes. Ele continua atravessando a BR para levá-las ao pasto e o trajeto continua arriscado. Sobre a covid, Canário gostaria que isso tudo acabasse e as pessoas voltassem a ter saúde. Ter saúde é melhor que ter dinheiro, ele acha, e talvez agora as pessoas entendam isso. Talvez não.

Canário  detesta usar a máscara, só usa quando é obrigado, porque não quer morrer sufocado de calor.  Ele diz que ouviu falar que o vírus é chinês, que foi a China que inventou por inveja do Brasil… Ao mesmo tempo, ele pensa que isso é estranho porque, segundo ele, o lugar onde primeiro morreu mais gente foi lá. Canário quer se vacinar mas ouviu dizer que, se a pessoa tiver com sintomas e for se vacinar, pode morrer. Se tiver doença nos ossos, a vacina pode matar também. Reclama que ninguém sabe direito como pega essa doença porque a esposa dele pegou, e ele e os meninos não, mesmo todos bebendo água da mesma tigela.

 

Canário conta que acabou de receber a última parcela do auxílio e diz que, se não fosse esse dinheiro, muita gente tinha passado necessidade. Canário conta que, quando teve o lockdown e a feira fechou, os ricos continuaram vendendo pela internet e os pobres, que dependem da feira para vender, se lascaram.

FAMÍLIA VILA CANAÃ

A família de Dona Maria, que já era grande, está ficando maior. Ela, a matriarca, e seus filhos Isabele, Romário, Lorraine, Mikaele e Mikael participaram do filme "Estou me guardando...", compartilharam conosco a sua rotina de trabalho, suas conversas e até os momentos de loucura em que venderam suas coisas para viajar para a praia no carnaval. A covid-19 não mudou muito a vida da família, nenhum deles se contaminou, nenhum deles usa máscara e Dona Maria não acredita nos números divulgados na imprensa. Mikael, o caçula, casou e hoje é pai. Isabele teve mais dois filhos. Lorraine terminou o casamento depois de ser agredida. A família é grande e agrega também tios e tias que se reúnem da casa de Dona Maria  aos domingos para conversar, participar do culto da igreja ou ficar de longe observando.

GAIVOTA

Gaivota é uma mulher trans que nunca foi aceita pelo mundo do jeans. Ela já tentou costurar, mas tem um problema na vista que a impede de passar muito tempo fazendo isso: tem fortes dores de cabeça. Já tentou ser vendedora, mas ninguém quis dar um emprego para uma mulher trans. Trabalhava em um bar, como garçonete e cozinheira, mas com a pandemia, perdeu o trabalho. Hoje faz faxina na casa de uma mulher que mora no centro da cidade. Gaivota ama a mãe acima de tudo e escreveu uma música para homenageá-la. O pai, ela prefere esquecer.

MARIA OZANA

Maria Ozana é uma mulher de mais de 60 anos, magra, cabelos brancos e longos. Ela ganha a vida vendendo cocadas nas ruas de Toritama há anos, mas o que mais gosta de fazer é escrever. Ela escreveu livros de poesias, crônicas e contos, que foram impressos e distribuídos por ela mesma. Apesar da história de vida difícil, ela preserva uma atitude poética frente à vida, alimentada por memórias de infância e sua relação afetuosa com a natureza e as pessoas. Duas de suas crônicas serão publicadas pela Editora Flip, em uma edição especial coletiva.

CAIO SILVA

Administrador do Shopping da cidade, ao lado da feira, responsável pela ambiciosa obra de ampliação do empreendimento. É um entusiasta de Toritama e adora contar as histórias de sucesso de quem veio de baixo e conseguiu chegar lá. Sabe todos os números do comércio de cor e acredita que o melhor negócio do mundo é fazer comércio em Toritama.

Para ele, Toritama não vende só jeans, Toritama vende o polo comercial. Tem jeans, modinha, calcinha, sutiã, malha, biquíni… O comércio em Toritama cresceu tanto que tem lojista de Brejo da Madre de Deus, Fazenda Nova, Vertentes, Surubim, Taquaritinga do Norte, vendendo na feira do domingo. Há empreendedores muito bem sucedidos, como por exemplo, uma lojista que é de Alcatil, na Paraíba, e vende lingerie. Ela produz lá e tem uma loja no shopping. Toda semana, ela só abre dia de feira, e lucra. Tem lojista que só abre dia de domingo, que é o dia da feira, quando chegam cerca de 30 mil pessoas. Por exemplo, tem gente que vende na feira e produz em Belo Jardim, tem uma marca que produz em Jardim do Seridó, no RN. Às vezes, o empreendedor é de Toritama, mas tem na cidade só a brand, a marca, mas mantém toda cadeia produtiva em outra cidade. Compra o tecido, corta lá, costura lá e vem vender em Toritama. Jeans, que é o forte na cidade. 

 

Segundo ele, Toritama não para de crescer. "Se você passar um dia na ponte ali, todo dia chega um caminhã de mudança. Todo dia, todo dia. É sério mesmo, de verdade."

FRANCIELE

Dona de facção e da sua própria confecção, a Afirmativo Jeans, Franciele é personagem marcante do "Estou me guardando...". Ela não tem papas na língua para falar o que pensa e não se interessa em agradar ninguém. Teve um filho recentemente, o que a afastou das vendas, mas continua tocando seu negócio em casa, cuidando da produção. Não tem medo de pegar a doença, nem de ficar sem trabalho. Confia na solidariedade de sua família, que é muito unida, e nem todos dependem do jeans para viver.

PEDRO

Pedro é personagem do "Estou me guardando...". Ele aparece brevemente no filme, apresentando as saias jeans evangélicas. Ele também é blogueiro, tinha uma página no facebook chamada Toritama Minha Terra, que depois vendeu. Hoje estuda educação física e administra 3 trabalhos ao mesmo tempo. Ele foi a primeira pessoa a se contaminar com covid-19 na cidade, e publicou tudo nas redes sociais. Sofreu preconceito por isso, e foi desacreditado por muita gente.

 

Hoje ele estuda educação física e trabalha para a prefeitura no departamento de Assistência Social. Sonha em montar seu próprio centro de treinamento, sua academia de ginástica em Toritama. Hoje, ele concilia o trabalho no CRAS com os estudos e ainda dá aulas como estagiário na academia do irmão mais velho. 

 

Pedro conhece muita gente que morreu de covid, mas nunca teve medo da doença, nem quando foi hospitalizado. Ele conta que, na cidade, nem metade das pessoas usa máscara, ou álcool em gel. Já em Caruaru, o povo é mais cuidadoso. Ele conta que até hoje não recuperou o olfato completamente. Segundo Pedro, a cidade ficou deserta no lockdown, porque o povo ficou com medo do desconhecido. Foi estranho de março a maio de 2020, mas em junho o pessoal começou a furar. Tem trabalhado e estudado muito, e não tem tempo pra nada. Diz que consegue ver o filho na hora do almoço. O sonho dele é não trabalhar para ninguém, ser dono do seu negócio. Reclama que Toritama é uma cidade cada vez mais cara. O aluguel é caro, alimentação, moto, terreno, tudo, por isso as pessoas precisam trabalhar tanto pra viver aqui.

A MÉDICA

A médica da cidade é jovem, negra e trabalha no hospital municipal realizando atendimentos de urgência. A maioria das pessoas que ela atende, chega com problemas relacionados ao excesso de trabalho. Ela tem uma visão interessante sobre Toritama, e procura sempre levar em consideração, ao atender um paciente, a sua origem, pois, para ela, a condição social é determinante no processo de saúde e doença. Ela acredita que em Toritama, as pessoas rapidamente irão esquecer que um dia houve pandemia e não tem esperanças de que um dia algo vai mudar a partir de então.

Segundo ela, em Toritama, no geral, as pessoas só se preocupam com a saúde quando não dá mais pra se preocupar. Elas não têm tempo. As pessoas costuram de manhã até meia noite. E isso ela pode ver dentro da própria família. Trabalha-se muito, até tarde, todos os dias. O povo tem um grande orgulho disso, de dizer que Toritama tem trabalho. Se tiver disposição, vai trabalhar. Os pacientes não têm tempo de se preocupar com nada além do trabalho, mas quando não dá mais eles têm que ir ao hospital. Dor de coluna, mulheres com dor de cabeça (sobrecarga). Muita gente vai ao hospital com doenças relacionadas à ocupação. Tendinite, estresse, cefaléia, problema osteomuscular. Só procuram médico quando estão mal, quando a falta de saúde atrapalha o trabalho delas. Isso é porque Toritama tem uma baixa escolaridade. O povo de Toritama deixa a saúde pra depois, porque é mais importante trabalhar. Aqui ninguém tem carteira assinada, ou você trabalha hoje ou não tem dinheiro amanhã.

CAROL

Carol Gonçalves tem 24 anos, é  filha de costureiros, e foi eleita a mais jovem vereadora mulher da história de Toritama. Ela está muito animada para colocar em prática suas ideias de campanha e conta com o apoio da juventude local, sobretudo das mulheres e da comunidade LGBT. Ela considera a produção do jeans o grande motor econômico da cidade, mas acha que a juventude sofre com a falta de opções de trabalho. Os jovens muitas vezes abandonam a escola para começar a ganhar seu próprio dinheiro e comprar as coisas que desejam, ou ajudar a família. Carol quer estimular crianças e jovens a sonhar com futuros diferentes, estudar e aprender sobre o mundo.

Carol conta que, apesar de tudo, a cidade segue crescendo e o Parque das Feiras agora conta com investimentos importantes. As novas bancas da feira acomodaram os antigos feirantes e outras estão sendo vendidas. Toritama é uma cidade difícil pra quem é jovem. Não tem curso técnico, nem superior, não tem transporte público. O moto-táxi custa 5 reais a corrida. Poucos jovens trocam o jeans pelos estudos, mas esse número está crescendo timidamente. Todos os dias, saem 15 ônibus da cidade para levar os estudantes para faculdades em cidades vizinhas. 

 

Carol conta que a cidade é muito desigual. E diz que a maioria das pessoas que trabalha com costura só tira o dinheiro da sobrevivência. Tudo precarizado, sem seguridade social. Ela acredita que a costura não pode  ser o único caminho e sim uma escolha. Com a pandemia, ela acreditou que as pessoas despertariam para a solidariedade e senso de coletivo, mas não sente que houve essa mudança coletiva. 

 

A família dela foi passar o lockdown no sítio e voltou a cozinhar com lenha para economizar o dinheiro do gás.  Carol conta que frequentava a Assembleia de Deus, mas sentia que os dogmas a privaram muito de suas liberdades. A eleição foi um marco para sua saída da igreja, porque a maioria lá defende abertamente o presidente, que ela reprova. Carol se identifica como uma feminista interseccional, desde que leu Angela Davis. Seus valores de igualdade, aprendeu com a mãe. Foi eleita com 770 votos e deve sua eleição à comunidade LGBT, universitários, mulheres jovens e pessoas que contribuíram voluntariamente para sua campanha. Ninguém acreditava que essas pessoas iriam se juntar e eleger uma representante: é algo inédito em Toritama alguém ser eleito por ideias e não por dinheiro. 

 

“O que as pessoas de Toritama mais precisam é de lazer. Do mais novo ao mais velho. A gente ia ter só 3 bandeiras: educação, mulheres e mandato participativo. Só que a gente pensou assim: tem muitas pessoas que querem saber mais se ta ganhando dinheiro do que se o filho tá aprendendo a ler na idade correta, tinha muito isso... A gente começou a procurar outras pautas que pudessem englobar o pessoal. Meio ambiente e lazer era o que os jovens mais se preocupavam. A educação nunca era uma preocupação. Infraestrutura, tipo esgoto a céu aberto, calçamento, lazer… Eram as pautas mais mencionadas. “

SABRINA

Sabrina é uma estudante e artista de 17 anos. Ela vive com a família, pai, mãe, irmã e irmão, em uma casa no centro da cidade. Sabrina está em uma fase da vida em que as mudanças são muito intensas e, como se não bastasse, veio essa pandemia. Ela acabou de concluir o ensino médio com aulas à distância e agora quer se preparar para o vestibular. Quer estudar psicologia. Como artista, ela compõe, faz poesias e é vocalista da  banda de rock Capitalistas Soviéticos. Ela costumava encontrar os outros integrantes da banda para ensaiar, e esse era um dos poucos momentos de lazer que desfrutava, mas com a pandemia ficou impossível.  No final de 2020, perdeu o avô precocemente para a covid-19 e desde então tem pensado muito sobre várias questões existenciais.

Sabrina lamenta que, enquanto jovem, “a gente se sente muito limitado pela indústria aqui” e conta que não tem uma turma grande em Toritama pois não se identifica com a maioria da juventude da cidade. Ela gosta de arte, o que não é muito comum na cidade. Ela se preocupa com as adolescentes que engravidam muito cedo, algumas são expulsas de casa, outras se casam, mas o destino delas é de pouca esperança. 

VAL

Val é uma mulher de cerca de 30 anos, comunicadora social e empreendedora de Toritama. Ela trabalha como assessora de comunicação e apresenta o programa de cultura na rádio comunitária da cidade. Nesse programa, que nasceu do seu projeto de conclusão de curso da UFPE, ela entrevista artistas de todas as áreas, de Toritama ou que tenham ligação forte com a cidade. A ideia de Val é valorizar a cultura local, influenciar as pessoas a conhecerem a arte, a cultura e despertar nelas a vontade de aprender e evoluir.

Valderiza gosta de falar sobre política. Ela diz que quem entender Toritama, entende o Brasil. Se considera uma sobrevivente nessa cidade em que o destino dos jovens, sobretudo das mulheres jovens, é muito limitado. Ela acha que Toritama é o que certos governantes querem que o Brasil seja. Uma cidade em que o Estado é mínimo e o neoliberalismo é máximo. Ela admite que o jeans é uma atividade importante para a cidade, mas lamenta que, para a maioria das pessoas, seja a única alternativa de sobrevivência.  Valderiza assistiu o filme "Estou me guardando pra quando o carnaval chegar" e gostou bastante. Debateu com colegas da faculdade, participou de debates e recomendou para várias pessoas. Ela acha que tem reflexões importantes e diz que é natural que uma parte da população não goste porque é "a primeira vez que a cidade se viu no espelho", e o que viram não é fácil de aceitar, principalmente para quem vive em busca de ilusões e promessas impossíveis.

ROBERTO

Roberto é uma das poucas pessoas que conhecemos em Toritama que nunca trabalharam com a produção ou comércio de jeans. Um outsider. Ele é estudante de psicologia e participou como voluntário da campanha de Carol para ser eleita vereadora. Ficou surpreendido com a vitória, não esperava isso de Toritama. Ele tem uma visão crítica do modo de vida adotado pelas pessoas da cidade e se preocupa com a saúde mental da juventude de Toritama.

Robs perdeu o avô, que morava na casa da mãe junto com a família, para o coronavírus. Foi muito difícil para ele, sobretudo para a mãe, que dedicava boa parte do seu tempo para cuidar do pai. Ele conta que a parte mais difícil é não poder se despedir. Robs conta que sua mãe ficou sem chão quando, depois de perder o pai, perdeu um irmão para a covid. Ela ficou sem dormir, adoecida, muito mal mesmo. Só começou a melhorar quando uma amiga e vizinha a convidou para voltar a trabalhar com jeans em uma facção. Ela foi para se distrair, sem compromisso de produzir muito, e hoje está melhor.

 

Ele faz parte da juventude de Toritama que sonha com um futuro diferente para si e para seus amigos. Ele reclama que as pessoas na cidade são muito imediatistas, querem plantar hoje e colher hoje. E dessa forma, acabam se rendendo ao jeans que, querendo ou não, dá sustento e dinheiro a quem precisa trabalhar e não tem estudo.

SEU AURÉLIO

No centro de Toritama, vive Seu Aurélio, o pedreiro que construiu um cinema com as próprias mãos, o único da cidade. Ele abre o cinema para nos receber e conversar um pouco. Erik, seu neto, está junto, como sempre. Já um adolescente. Seu Aurélio nos mostra a reforma que fez nas cadeiras: trocou o encosto, que agora está mais firme e confortável. Fez isso para se ocupar, além de outras pequenas reformas no teto, nas paredes… Ele conta que passou o filme Estou me Guardando várias vezes no cinema e que foi um sucesso enorme, durante semanas. Seu Aurélio contraiu covil-19 e ficou muito doente. Segundo ele, "quase não escapa". Recebeu profissionais de saúde em casa para cuidar dele. Teve muita febre, dor no corpo, perdeu a energia totalmente, não conseguia nem comer, emagreceu muito e teve que tomar soro na veia. O neto, Erik, ficou muito preocupado, com medo de perder o avô. Ele também pegou a doença, em uma versão mais leve. Seu Aurélio perdeu algumas pessoas queridas para a doença, dentre elas um amigo seu, companheiro de caminhada, com quem saía todos os dias para andar e se exercitar. Se sentiu muito só, no auge da doença e do isolamento. 

 

Depois que melhorou, ainda em isolamento, tirou as cadeiras do cinema para ficar caminhando dentro do espaço. Reformou o cinema e passou filmes só para os netos. Apesar de não saber quando é que o cinema volta a funcionar, ele acredita que as salas de cinema não vão acabar. O amor dele pelo cinema, pelo menos, vai durar a vida toda.

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